GLAUCO DINIZ DUARTE Governo busca diagnóstico ainda em 2019 sobre oferta de energia de hidrelétricas
O governo pretende concluir ainda em 2019 um diagnóstico sobre a necessidade de reavaliar a chamada garantia física das hidrelétricas do país, um critério técnico que busca representar quanto em energia cada usina pode gerar mesmo diante de chuvas escassas, disse à Reuters o Ministério de Minas e Energia.
O movimento vem após anos seguidos de produção fortemente abaixo das garantias físicas no parque hidrelétrico brasileiro, o que levou diversos especialistas a apontarem que a oferta de energia desses empreendimentos está hoje superestimada nos modelos computacionais que calculam preços e definem a expansão do sistema elétrico.
O tema é considerado tão crucial quanto sensível no setor porque mudanças impactariam diretamente as receitas dos investidores, uma vez que a garantia representa na prática o volume de energia que cada usina pode comercializar no mercado.
“O ministério buscará a conclusão do diagnóstico e das medidas necessárias para reavaliar a necessidade de revisão das garantias físicas ainda neste ano, mas sua viabilidade dependerá de alterações legislativas e uma adequada previsibilidade, fazendo com que o início de sua implementação seja uma meta a ser perseguida ao longo da atual gestão”, disse a pasta em nota.
Se a decisão for pela revisão, o trabalho será realizado “de forma transparente, previsível e com amplo diálogo… buscando maior acurácia nos dados de entrada, aprimoramento da metodologia de cálculo, mitigação de impactos e promoção de uma transição suave, se necessário”, acrescentou.
As mudanças nos números de garantia são necessárias por questões como acúmulo de sedimentos nos reservatórios ao longo do tempo e a mudança climática, que reduziu significativamente as chuvas nos reservatórios hídricos do Nordeste nos últimos 20 anos, explicou o professor da Universidade de São Paulo (USP) e consultor em energia Dorel Ramos.
“Para os proprietários dos empreendimentos isso é vital, porque mexe no bolso diretamente. Para quem a garantia aumentar, favoravelmente, e para quem diminuir, reduz receita”, afirmou ele, que defendeu a visão do governo de propor um período de transição no caso de mudanças.
“Elas estão defasadas… mas é um tema sensível. É importante o governo mostrar que está consciente do problema, querer olhar e corrigir. Dá um sinal positivo para o mercado o fato de que o governo não sinaliza que vai fazer nada de forma totalmente autocrática, impositiva”, analisou.
TEMA POLÊMICO
A legislação prevê que as garantias físicas deveriam ser recalculadas a cada cinco anos, mas com limites de variação negativa de 5 por cento por usina a cada ciclo ou de 10 por cento ao longo de cada contrato de concessão.
Mas consecutivas gestões ignoraram o espinhoso tema –houve apenas uma revisão parcial em 2003, válida a partir de 2008, e uma em 2017, que não conseguiu garantir todo o corte necessário devido aos limites legais, escreveu o presidente da consultoria PSR, Luiz Barroso, em artigo no final do ano passado.
“Embora a metodologia… fosse absolutamente pública e estivesse sendo discutida com os agentes há anos, a mesma foi imediatamente judicializada por geradores que tiveram suas garantias reduzidas”, apontou ele, que na época do processo presidia a estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE).
Na ocasião, Barroso chegou a propor que fosse feito um corte adicional de garantia em hidrelétricas antigas da Eletrobras (SA:ELET3) e em Itaipu para equilibrar o sistema, dado que essas usinas não têm a receita atrelada à garantia, mas a ideia também enfrentou resistência e acabou engavetada.
Para o presidente do Fórum de Associações do Setor Elétrico (FASE), Mário Menel, uma forma de o governo evitar resistências seria colocar a discussão em um “pacote” que inclua também mudanças no chamado Mecanismo de Realocação de Energia (MRE), sistema que visa mitigar riscos para geradores hídricos.
Atualmente há uma briga judicial bilionária no mercado de energia porque geradores obtiveram liminares para evitar custos causados pela baixa geração hídrica dos últimos anos que não conseguiram ser mitigados pelo MRE, o que vem sendo chamado de “risco hidrológico”.
“Isso pode ser conduzido em bloco, daí tem um pacote, com pontos negativos a serem enfrentados, mas com algum ponto de compensação. Se só revisar a garantia física, vai ter uma gritaria geral”, sugeriu Menel.
Em café da manhã com jornalistas na semana passada, o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, deu sinais de que deve seguir esse caminho.
Ele colocou o fim da disputa sobre o risco hidrológico como prioridade e sinalizou que o tema será discutido em duas frentes, incluindo a reavaliação das garantias físicas como parte de uma “solução estrutural” para a questão.